Menina vê seu reflexo como cientista no espelho. Ilustração: Andressa Meissner
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Ilustração: Andressa Meissner

Como é uma pessoa cientista? Perguntamos para meninos e meninas o que eles acham do assunto – e a imaginação voou alto.

Por Alice Martins Moraes, Bárbara Paes e Rafaela Lopes Falaschi

Ciência é uma opção de futuro para as garotas? Segundo o Instituto de Estatísticas da Unesco, apenas 28 por cento dos pesquisadores do mundo são mulheres. E, mesmo com os avanços no decorrer do tempo, as mulheres continuam sendo sub-representadas, principalmente nas áreas de ciência, tecnologia, engenharia e matemática (STEM, na sigla em inglês) e em especial em posições de liderança na pesquisa. Não é que elas não existam ou não façam ciência. É que à medida que os cargos sobem a representatividade das mulheres cai.

Estudos mostram que um dos motivos para essa desproporção é a construção de estereótipos ligados a gênero que envolvem, inclusive, a própria ciência. Um estudo feito na Suécia com 1.327 estudantes, publicado na revista científica Sex Roles, em 2017, mostrou que a sensação de “pertencimento social” guiava a escolha de mais homens para carreiras em STEM e mais mulheres para áreas de saúde, ensino básico e doméstico, mesmo em um país com maior equidade de gênero. 

Mas o que é o “pertencimento social”? De acordo com o estudo, adolescentes sentiam que se encaixariam melhor em áreas onde há maior presença do seu próprio gênero. E, numa espécie de ciclo vicioso, as meninas ainda parecem sucumbir ao estereótipo de não serem tão capazes quanto os meninos em áreas STEM, apesar de os terem superado em todas as disciplinas escolares.

Esse tipo de percepção pode começar muito antes de chegarem às universidades, ainda no início da vida escolar. Um outro estudo publicado por pesquisadores norte-americanos na revista Science, em 2017, mostra que garotas de cinco anos têm a mesma probabilidade de meninos de dizerem que “meninas podem ser muito, muito espertas”. Dos seis anos em diante, no entanto, elas passam a achar que o brilhantismo é muito mais provável em garotos. Nessa mesma idade, as meninas desenvolvem maior interesse por jogos para crianças “que trabalham duro” do que aqueles para crianças “que são muito inteligentes”. De novo, o fenômeno ocorre mesmo que essas garotas tenham melhor desempenho nas matérias escolares do que os seus colegas meninos.

O vazamento no encanamento: porção de mulheres na educação superior e pesquisa, 2013 (%). Ilustração: Andressa Meissner

Em que momento essas meninas são ensinadas que elas podem menos? No Festival WoW - Mulheres do Mundo, todos os participantes foram convidados a discutir igualdade entre homens e mulheres, até mesmo as crianças. Nas oficinas “Brincando e construindo igualdade de gênero“, meninas de 6 a 10 anos e meninos de 8 a 10 anos foram separados em grupos e convidados a brincar de casinha. Durante a atividade, as crianças foram estimuladas a refletir sobre o que é uma família e dividir aquilo que eles ouvem sobre o que podem ou não fazer por serem crianças, meninos e meninas.

Para os meninos, eles podem brincar de boneca, mas simplesmente não brincam. Todo mundo pode brincar do que quiser. Chorar não tem problema, todo mundo chora. Não tem problema o cabelo, não tem problema as roupas – “mas saia deve atrapalhar para jogar futebol“, refletem.

As meninas não estavam tão convencidas. Elas ouvem que “menina não pode fazer bobagem, não pode fazer bagunça, não pode jogar bola, andar de skate, brincar de boneco e videogame, só pode brincar de boneca, fazer maquiagem”, enquanto meninos “não podem fazer as unhas do pé”. “Isso se chama machismo”, argumenta uma delas, já familiarizada com os termos da discussão.

Observamos a prática de longe, com nossos olhares atentos, e depois entrevistamos as crianças para saber qual é a percepção que elas têm de um(a) cientista. Ao serem incentivadas a descrever a imagem de uma pessoa que faz pesquisa, as respostas foram diversas e a imaginação voou alto.

Ouça os depoimentos:

Enquanto as crianças se expressavam e conheciam cientistas, o debate sobre os estereótipos de gênero na ciência esteve presente em diversos momentos do Festival WoW 2018. E assim, entre diálogos, trocas e brincadeiras, são desconstruídas, aos poucos, as percepções que ainda afetam nossas meninas e nossa sociedade. Pela percepção que tivemos da sabedoria das crianças, parece que temos um futuro promissor.

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